terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Gradação.

Os pés pesavam no assoalho, arrastavam-se de forma irritante, como se assim pudessem evitar que o silêncio absoluto se instalasse. Jantava ao som do diálogo dos talheres, do engolir seco da comida com gosto de todo dia. Tossia sem vontade ou deixava escapar um suspiro proposital, só para confirmar se ainda tinha alguma voz dentro de si. “Meu dia foi bom” afirmava mentalmente. Embora não parecesse, somente uma das cadeiras ao redor da mesa estava vazia. E era ele, o vazio, o centro das atenções.

A porta do quarto rangia toda vez que era aberta -gostava daquele ruído inoportuno. Lia, lia com sede de palavras que falassem por ele sem precisarem ser ditas; ousava rabiscar algumas frases perdidas e sem sentido quando não as encontrava perdidas pelas páginas alheias. Ouvia música; gostava de ter a alma exposta, mesmo que a dele não fosse. Em meio ao silêncio disfarçado, protegido em seu refúgio, ele adormecia.

Uma mão afagaria-lhe os cabelos, recolheria seus livros caídos ao chão, devolveria o silêncio ao ambiente, instalaria o escuro acolhedor. Nunca soube se em sonho ou não, mas um beijo sempre lhe era depositado na testa. Aquele era o amor que conhecia : nas entrelinhas, o subentendido.

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